A vocês que me lêem, eu me confesso: não há nada como descobrir pérolas como estas no meio das resmas de filmes que saem cá p'ra fora todos os dias. Quando estamos a vê-los pela primeira vez, no escuro do nosso quarto, quantas vezes no mais silencioso momento da madrugada, é como se nos sentíssemos uns privilegiados por estarmos ali, naquele momento, a saborear aquele filme. Foi o que me aconteceu ontem quando me cruzei com este "Houve Uma Vez Dois Verões".
Já tinha ouvido falar de Jorge Furtado, embora não tivesse ainda visto nada dele. Sabia que, junto com Guel Arraes (de quem vos falarei com certeza em breve), tinha estado na origem de toda uma nova vaga de cinema brasileiro mais preocupado em contar outro tipo de histórias que não apenas as relacionadas com os problemas sociais da sua sociedade. Não que os ignore, mas combatê-los abertamente não faz exactamente parte da sua cruzada.
Este filme que hoje vos aconselho deambula entre a comédia e o drama, sem nunca optar exactamente por um deles, mas sem que isso prejudique a estória em si. Chico (André Arteche) é um adolescente que, numa noite de Verão, é levado a perder a virgindade com Roza (Ana Maria Mainieri), uma jovem que conhece num salão de jogos. Quando esta lhe liga a dizer que está grávida e que quer fazer um aborto, ele sente-se responsável e, apaixonado, oferece-lhe mil reais para ajudar às despesas do aborto. Quando se apercebe que foi ludibriado, parte em busca de Roza para repor a verdade.
Furtado opta por levar o filme de forma aparentemente ligeira, mas sem nunca perder o ponto de vista a que se propôs. O grande trunfo do filme está precisamente aí e no facto de o realizador nunca julgar os seus personagens, arriscando até um final diferente do que seria habitual. Apesar do amadorismo de André Arteche (ou por causa disso), "Houve Uma Vez Dois Verões" transporta consigo uma candura e inocência que já raramente se vê no cinema actual.
Sem ser uma obra-prima, este é, sem dúvida, um filme que merece toda a atenção e apreço.
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